Em meio à crise causada pelo coronavírus, coletivo de empreendedoras inova para fortalecer vendas

Há quase três anos, Amanda Túlio organiza um bazar apenas com empreendedoras mulheres, em Curitiba.

Elas vendem roupas, acessórios, produtos pets e alimentos, entre outros. Também fazem tatuagens e colocam piercings. A última edição do evento, em dezembro de 2019, reuniu 45.

Em maio deste ano, Amanda estava programando fazer o bazar para o Dia das Mães, mas, a pandemia do novo coronavírus não permitiu.

Então, a jovem de 23 anos decidiu colocar em prática o plano que já tinha de ter uma versão virtual do “Bazar das Manas”, como o coletivo é chamado.

“Faz um bom tempo que eu tenho em mente realizar uma loja colaborativa física e online. Devido à pandemia, muitas meninas – incluindo eu – pararam de ter renda. Por isso, a melhor opção foi realizar o bazar online”, explicou Amanda.

Transição para o digital

Ela contou que essa transição do presencial para o digital foi um desafio. Amanda precisou preparar vários conteúdos para orientar as expositoras.

“Eu fiz uma curadoria e selecionei todas que se inscreveram e enviaram o material solicitado no prazo”, disse.

Trinta expositoras vão participar do “Bazar das Manas” na internet. Ele ocorre entre esta sexta (5) e segunda-feira (8). Acesse a plataforma.

O frete das compras tem um valor fixo de R$ 17, e as entregas são feitas por motogirls.

'Novo normal'

Para Amanda, esse formato digital do evento é o “novo normal”. Ela pretende realizar o bazar virtual mais vezes, mesmo depois que pandemia passar.

“É prático, fácil. A pessoa não precisa nem sair da cama para adquirir um produto local. Se tudo der certo, quero realizar envios para todo o Brasil”, afirmou.

Amanda avalia que, a crise gerada pelo novo coronavírus, atinge o empreendedorismo feminino de maneiras positiva e negativa, ao mesmo tempo.

“Por um lado, fez muitas perderem clientes e até fecharem os negócios secundários que geravam uma renda extra. Por outro lado, eu vejo como uma oportunidade de se reinventar novamente e até tirar planos do papel”, analisou.

Nesse momento difícil, Amanda conta que tem buscado trazer ainda mais mulheres para o coletivo. Assim, todas podem se ajudar e crescer juntas.

Como o coletivo começou?

Amanda passou por uma situação de assédio em um emprego. Incomodada com isso e por perceber o quanto as mulheres eram desvalorizadas no ambiente de trabalho, resolveu tomar uma atitude.

“A gente tem que se unir e crescer juntas. Tirar a ideia de que mulher bate de frente. A gente tem que se unir para crescer”, afirmou.

O bazar acabou surgindo depois de Amanda conseguir promover um encontro, por meio do Facebook, para vender roupas usadas. A partir disso, viu a necessidade de contribuir de uma maneira mais ampla,

“O intuito é de fazer a mulher empreender, ajudando uma a outra para que tenham seu dinheiro e não passem por situações de assédio”.

Amanda contou que o “Bazar das Manas” contribui para o desenvolvimento dos empreendimentos das mulheres que participam dele.

“Faço uma pesquisa depois de evento para ver como foram as vendas, se foi bom. Umas dizem que o bazar mudou a vida delas, criou oportunidades e deu novos clientes”, disse.

Mulheres empreendedoras no Paraná

As mulheres representam 43% do total de empreendedores no Paraná, de acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

O número é referente ao fim de 2019. Até 2016, segundo o Sebrae, as mulheres correspondiam a 31,5% dos empreendedores. De lá para cá, elas conseguiram conquistar mais espaço.

“A diferença de percentual entre 2016 e 2019 , pode ser considerada muito boa por representar quase a metade do total de empreendedores do estado. No entanto, os números devem ser olhados com cuidado. Isso porque existe diferença entre as motivações para empreender”, afirmou a professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Jane Mendes Ferreira Fernandes.

Jane dá aulas de administração para cursos de graduação e pós-graduação da UFPR e, desde 2004, estuda o empreendedorismo feminino.

Oportunidade x Necessidade

Conforme a professora, o relatório de Monitoramento de Empreendedorismo Global – o Global Entrepreneurship Monitor (GEM) – diferencia o empreendedorismo por oportunidade do empreendedorismo por necessidade.

O empreendedorismo por oportunidade, como explicou Jane, é quando o empreendedor ou empreendedora percebe alguma lacuna no mercado. Enquanto o empreendedorismo por necessidade é quando se empreende por não ter uma opção de emprego.

“Ao olhar para esse crescimento temos que ter o cuidado para não se confundir empreendedorismo com falta de opção de emprego”, explicou a professora.

1,3 milhão de empresas

O Paraná tem pouco mais de 1,3 milhão de empresas – entre microempreendedores individuais (MEIs), microempresas e empresas de pequeno porte, ainda conforme os dados do Sebrae.

Ao todo, são 1.354.543 empresas em todo o estado. Isso significa, de acordo com o Sebrae, que 582.453 empresas são comandadas por mulheres.

“O ganho de espaço da mulher no mercado de trabalho e no empreendedorismo é uma tendência que vem se confirmando ano a ano e com certeza indica que a mulher está ocupando um espaço que é dela, mas que por muito tempo foi negado em função das condições culturais do nosso país”, afirmou Jane.

Para a professora, a ideia da mulher cuidadora, aquela é que única responsável pelo cuidado da casa e dos filhos, ainda existe e traz consequências negativas. “Coloca uma carga muito grande de atividades sob a responsabilidade da mulher e pode limitar o tempo que ela dedica aos negócios”.

Jane disse que ainda há muito o que mudar nesse quesito. Ela enfatizou que não se trata de ter “ajuda” dos homens, mas de ter o entendimento de que é necessário haver uma divisão justa de atribuições.

“O empreendedorismo feminino é um dos elementos que diminui as relações assimétricas de poder que ainda existem em nossa sociedade, possibilitando oportunidades iguais a todos”, afirmou a professora.