“Tio Zózimo – O gibi com a heroína da cidade – Primeira parte”

Como dizia a Betona, o caso foi de tirar pica-pau do toco. E aconteceu parece que faz séculos. A turma da Rua de Baixo tinha chegado ao colégio naquele ano. Já tinham sido avisados. Cuidado com a turma do Licurgo. Eles costumam perseguir e extorquir os alunos novos.

Mas, havia notícias boas, também. Cantigas de amor. Carpe diem. Amor é fogo que arde sem se ver. As novidades trouxeram consigo o barquinho dos afetos. Olhar em volta e descobrir ternas belezas.

Meninas. Seus cadernos longamente caprichados. Cabelos desenhados. Concentradas em risos e estudos. Ficou difícil se aprofundar nos barrocos da vida. Pecado e perdão. Tudo isso, eles viviam, sem tirarem os olhos de Licurgo e seus comparsas. Sempre suspeitos com suas roupas pretas.

Mas já no final do trimestre, os mapas e poemas mostravam que elas, as meninas, dirigiam seus olhares, suspiros e dengos somente para os rapazes do terceirão. Ou para os motoqueiros que roncavam suas máquinas de uniforme escuro na esquina.

Hadyja, Emyle, Lu, Fran, Dry, Gabi, Lara, Sara, Débora, Selma, Ruth, Ana, Isa, Lívia, Bianca, Andressa. Seus olhares não são para nós? Escandir seus nomes em rimas ricas, compor canções em vão. O tédio. A fuga. Elas nem aí.

Nesta encruzilhada, baseados nas epopeias dos velhos camões, em uma távola redonda, passaram a planejar um revide para esta situação. O ataque. A vingança. Não serem merecedores dos olhares delas? A ideia nasceu do vento. Um gibi em homenagem à professora nova. Ciências ou Português? Colunas incomparáveis. Voz e dedicação. Mestra incomparável. Suas botas tiniam no corredor castigando cada coraçãozinho.

Jeffs no roteiro. J. Gê nos diálogos. Sidney, a capa. Yagus, a correção. Convidaram o Rogê Çurié para as ilustrações. Todo cuidado era pouco, os Licurgos sempre eram uma ameaça.

As meninas nem desconfiavam, mas apreciaram muito o distanciamento. Podiam estudar mais. Eles não procuravam mais chamar a atenção a toda hora, envolvidos em seu projeto. O gibi.

Tio Zózimo achou que ia ficar bem se relacionassem o conteúdo da matéria da bela professora com a cidade. Desenhando a praça. O cinema. As lojas marcantes. Buri, Novidades, Marília. Bar Tip-top. A Fonte Luminosa. A avenida com carros. Jeep, Volks, Corcel, Wariant, Opala. O Galaxie do promotor. A rural do dono da Máquina de Café. O Karmann-Ghia do presidente do Clube. O Simca Chambord do gerente do Banco. A motocicleta importada do Jair do Globo da Morte. O DKW do goleiro do MEC.

Capricharam no enredo. A professora heroína, em cada esquina da cidade. Decifrando enigmas. Destruindo vilões. Dislalias e dislexias. Tudo na moita. Nem Licurgo nem as meninas desconfiavam.

Gostaram tanto do trabalho que imprimiram, na Gráfica do Seo Juca, 25 exemplares. Era a quantidade que o dinheirinho que juntaram conseguia pagar.

Não se sabe se alguém tinha vazados informações. Spoilers e buchichos. Mas já corriam boatos. Os meninos se vingando das meninas? Um gibi perigoso? O suspense. Gente curiosa. Gente com medo. Vontade de ver o circo pegar fogo. O Licurgo já sabia?  O diretor quis explicações. Amanhã no meu gabinete, sem falta. (to be continued)