Yeshuah

Pois foi essa a proposta do quadrinista Laudo Ferreira quando começou, a produzir a série Yeshuah. Laudo se baseou em uma pesquisa de textos apócrifos de diferentes religiões sobre Jesus, além de sua própria visão autoral, tentando resgatar a imagem do Filho de Deus de mito intocado, idolatrado e temido para algo mais próximo, humano e, portanto, também imperfeito. 
A história de Jesus Cristo, o filho de Deus, do seu nascimento em Belém de Judá, no tempo do rei Herodes, até a sua morte crucificado por ameaçar a ordem social por meio de mensagens de amor ao próximo.
Na primeira parte, o leitor acompanha Jesus e seu irmão como seguidores do profeta João Batista. No meio do Jordão, entre tantos fiéis, eles conhecem Maria Madalena, uma mulher independente e desejosa de conhecer novas verdades espirituais, virtudes que acreditava ter encontrado no Batista, até conhecer o misterioso Jesus.
Já na segunda parte, é mostrada a formação dos seguidores de Cristo, a entrada de Madalena no grupo e como reagem os altos sacerdotes diante do aparecimento de um novo e carismático pregador, logo após a morte de João Batista.
A terceira e última parte aborda os desdobramentos políticos e religiosos que os ensinamentos e curas do novo profeta provocam entre judeus e romanos. Muitas vezes incompreendido pela própria família, pelos sacerdotes, por parte do povo e até mesmo por seus discípulos, Jesus procura viver de acordo com suas crenças até o fim. 
Tanto quanto os livros que compõem a Bíblia, mais especificamente o Novo Testamento, Jesus Cristo é um personagem passível de várias interpreta ções na literatura, teatro, artes visuais, cinema e quadrinhos produzidos no mundo ocidental.

Dentre os exemplos, a visão do grego Níkos Kazantzákis, no livro A Última tentação de Cristo de 1951 é completamente afastada dos evangelhos, o protagonista seguia os passos do pai na carpintaria para fabricar cruzes para os romanos, além de colocá-lo como uma figura sexualizada. Apesar de explorar o seu lado humano, tanto a obra quanto o filme homônimo, de Martin Scorsese feito em 1988, foram condenados pela Igreja Católica.
Baseado nos Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João e em estudos de textos apócrifos e históricos, Yeshuah que significa Salvação, em hebraico, não foge à regra e coloca a visão pessoal do quadrinhista Laudo Ferreira nas quase 500 páginas do álbum.
No posfácio assinado pelo autor, ele frisa que a história de Jesus não foi alterada ou questionada, tampouco desmistificada ou satirizada. Partiu simplesmente de um ato de crença pessoal.
Com os nomes, locais e termos traduzidos para o hebraico, a passagem do filho de Deus pela Terra é contada por uma discípula que foi deixada de lado e engolida pela História, Maria Madalena. Após presenciar o que aconteceu com Jesus no momento do batismo, Maria é a primeira a perceber a importância espiritual daquele homem vindo de Nazaré. Uma mulher independente e segura de si, mas que é alvo de preconceitos do seu tempo, apoiado totalmente no patriarcado.
Ela se mostra um elo importante para ser mostrado o lado humano de Cristo na sua totalidade. É com Madalena que Jesus divide suas inquietações e dúvidas. Mesmo enfatizando a perspectiva mais humana e histórica de Jesus, Laudo Ferreira não abandona as interpretações míticas/místicas e muito menos a espiritualidade contida nos seus ensinamentos, seus milagres e a propagação de suas mensagens de amor e fé. 
Antes da edição definitiva, a Devir havia publicado a obra como uma série em três volumes: Yeshuah – Assim em cima assim em baixo (2009), Yeshuah – O círculo interno o círculo externo (2010) e Yeshuah – Onde tudo está (2014). 
Independentemente de polêmicas e da “verdade absoluta” em cima de um personagem tão controverso e fascinante, Laudo Ferreira apresenta em Yeshuah Absoluto um filho de Deus como uma pessoa carregada de virtudes e defeitos que poderia ser qualquer um ser humano, mas nos deixou uma mensagem semeada até hoje, mais de dois mil anos depois: o amor.