Apagão de profissionais
O Brasil caminha lentamente para um cenário de pós-pandemia, com diversos obstáculos para a retomada plena da economia. Entre os problemas, a geração de empregos. A taxa de desemprego no país atualmente é de 9,2%, e isso significa que quase 10 milhões de pessoas estão buscando uma oportunidade para voltar ao mercado, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Se em algumas regiões falta emprego, em Mandaguari a situação é inversa. Recrutadores ouvidos pela reportagem do Jornal Agora apontam que há vagas, mas falta mão de obra qualificada. O momento é de ampla empregabilidade, onde os profissionais podem escolher onde querem trabalhar e onde oferecem melhores condições de trabalho e isso acaba causando um “relaxamento”, onde não veem mais a necessidade de se especializarem e buscarem qualificação.
Com isso as vagas que necessitam de profissionais qualificados e com experiência na área ficam difíceis de serem preenchidas, aponta a recrutadora Simone Figueiredo, da Avante Soluções em RH. “Atualmente o que acontece é que as empresas estão procurando cada vez mais mão de obra qualificada e isso está faltando no município, por isso a demanda nunca é preenchida. Muita gente está procurando um emprego, mas quando olhamos o currículo vemos que as pessoas não têm uma responsabilidade muito grande pois não permanecem muito tempo em um trabalho, não ficam nem seis meses que é o período de experiência, então não nos passam segurança de que ela vai entrar na empresa e vai permanecer lá. Hoje procuramos pegar pessoas que já são qualificadas para as áreas das vagas, que tenham um bom currículo, uma boa permanência nas empresas em que já trabalharam e tenham responsabilidade”.
“O que dificulta também é que as empresas estão bem exigentes. Muitas pessoas também não tem um currículo muito bom porque tem muitas passagens curtas por várias empresas, por exemplo, fica dois meses em uma, um mês na outra, quinze dias na outra, e por assim vai. Ela não consegue se fixar em um lugar e isso é um coisa ruim”, complementa.
Para conseguir preencher as vagas em aberto, muitos empregadores tem pensado em soluções “fora da caixa”, como contratar pessoas mais velhas e importar mão de obra de outras cidades. Exemplo recente é a Romagnole, uma das maiores empregadoras do município, que lançou uma campanha para contratar profissionais com 50 anos ou mais. Ainda assim, a empresa mantém iniciativas como Jovem Aprendiz, para dar espaço a novos talentos no mercado de trabalho.
“São alternativas válidas. Atualmente as empresas estão buscando cada vez mais pessoas mais velhas para trabalhar, justamente por essa experiência e essa responsabilidade porque os jovens não estão tão comprometidos com isso. Vemos muitas empresas tentando contratar pessoas mais experientes e a faixa etária está variando de 25 anos para cima”, conclui Simone Figueiredo.
Mesmo com a dificuldade para preencher vagas, Mandaguari continua com saldo positivo no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado mensalmente pelo Ministério da Economia. No primeiro semestre do ano, a cidade registrou 3.023 contratações e 2.586 demissões, resultado em 437 novos empregos com carteira assinada.
Os setores que mais contrataram foram Indústria (253 vagas), Comércio (90), Serviços (59) e Construção Civil (33). Com estes números, Mandaguari é a segunda cidade da região da Amusep (Associação dos Municípios do Setentrião Paranaense) que mais gerou empregos formais de janeiro a junho.
Os números poderiam ser melhores, avaliam Jane Maria Soares e a vereadora Claudete Velasco, que coordenam a Agência do Trabalhador de Mandaguari. “Está havendo disputas entre as empresas para contratar funcionários qualificados”, conta Claudete.
Como forma de amenizar a falta de qualificação, a atual gestão anunciou o programa Capacita Mandaguari, que disponibiliza cursos profissionalizantes em diversas áreas. “Nós escolhemos os cursos de acordo com a demanda da cidade, é gratuito e para todas as idades, e muitos desses alunos já saem contratados por alguma empresa. Por isso é importante as pessoas fazerem para que tenham grandes chances de começar a trabalhar e já se qualificar”, conta Jane.
O programa de capacitação tem ofertado cursos como mecânico de bicicletas, pedreira, desenvolvimento de aplicativos e até instalação de placas solares. Mesmo assim, os cursos não tem muita procura. “A demanda tem sido baixa, porque muitas pessoas não ficam sabendo, ou por conta do horário. Por isso mudamos as formações para o período noturno ou final de semana”, complementa.
A reportagem consultou também pessoas que estão procurando emprego. Alguns moradores relatam que uma grande dificuldade na hora de se colocar em uma vaga não é só a falta de qualificação, mas também a falta de experiência. Nesse sentido, a Agência do Trabalhador tenta encontrar um meio termo, caso a caso. “Muitos empresários exigem experiência, mas é difícil encontrar, então conversamos com eles e perguntamos se pode ser uma pessoa com o perfil para aquela vaga e tentar negociar. Negociamos também a idade e o primeiro emprego. Mas muitas empresas gostam de pegar pessoas para o primeiro emprego, gostam de ensiná-las e moldá-las do jeito que elas querem e isso fica mais prático e dinâmico do que contratar alguém que já tenha experiência na área”, ressalta Claudete.
Mas qual seria a melhor alternativa e as ações para contornar o problema da empregabilidade? Não há um consenso entre todas as partes envolvidas. Uma das alternativas é as empresas e agências se organizarem para reformular o modo como estão ofertando essas vagas e fazer uma nova pesquisa salarial, que esteja de acordo com a realidade atual, alinhar a expectativa do mercado com a empresa e o profissional e ter uma conversa franca sobre quais são os requisitos e exigências do candidato e o que a empresa espera dele, pois a contratação nada mais é que um acordo de interesses, onde os dois lados precisam sair ganhando. É necessário estimular também uma política de gestão de pessoas na empresa que promova a atração de talentos e crie uma imagem atrativa ao público que deseja crescer profissionalmente e ter seu talento potencializado.
Reportagem publicada na 384ª edição do Jornal Agora