A injustiça e a lei da atração

“Você cria a sua própria realidade”. Há alguns problemas sérios nessa frase. Tanto pela amplitude de sua aplicação, quanto pela simplicidade de sua afirmação. Mas eu quero abordar apenas um dos problemas, apesar de pincelar um pouco os outros durante o texto. A Injustiça.

Afirmar que “você cria sua própria realidade” é, para muitos, reconfortante, pois sugere que somos os artífices de nosso destino, que nossos pensamentos positivos moldam nosso futuro. Mas além de ser simplista ao ponto de ser comparável à pareidolia – enxergar objetos em nuvens – sempre que comparado com fatos importantes do convívio social, essa frase tende a se despedaçar, e com muita frequência, ofender aqueles que acreditam nela.

A visão de que a realidade é inteiramente moldada por nossos pensamentos é uma utopia, pois deixa de considerar muitos fatores, como circunstâncias sociais, econômicas e biológicas, e esses têm um papel crucial em nossas vidas. Onde você nasceu impacta nas decisões que terá no futuro, o seu núcleo familiar também é relevante, o país, estado, cidade e bairro também terão seu papel, seus pais e professores, sua condição de saúde, as perdas familiares, sua cognição, o acesso que teve a estudos, trabalho, etc. todos são desprezados pela facilidade e simplicidade da frase que é por definição, incompleta.

Se aprofundarmos, essa percepção distorcida pode até desrespeitar a dor daqueles que enfrentam obstáculos imensos, pois ao aplicar essa ideia àqueles que carregam o fardo da injustiça, a narrativa se complica.

Imagine, uma criança que nasce em meio à pobreza, sem oportunidades. Ela enfrenta um sistema social rígido e desigual, de opções limitadas. Seria justo alegar que essa criança cria sua própria realidade? Ou seria mais sensato reconhecer que as circunstâncias a criaram?

Nesse ponto, o debate entre determinismo e livre-arbítrio tem sua convergência. Quando vemos com nossos olhos a injustiça, a teoria de que podemos criar nossa realidade vacila. O sofrimento não escolhe baseado em pensamentos positivos ou negativos. Ele não é uma simples criação da mente. Ele é real, tangível e muitas vezes decorrente de forças externas.

O destino é entrelaçado com oportunidades, privilégios, desvantagens e, sim, injustiças, e muitas delas são necessárias para que possamos evoluir como seres humanos. Mas se estivermos presos a um dogma trazido por uma frase ingênua, podemos praticar a injustiça, ao sugerir que aqueles que não conseguem melhorar suas vidas simplesmente não estão tentando o suficiente, ou pior, ao responsabilizar a vítima, ao acreditar que aquela realidade é culpa da pessoa que não soube criar uma realidade melhor para si.

O que isso nos ensina? Que nada é tão simples, que o mundo ainda é feito de injustiças, onde há vítimas e agressores, e que enxergar esse mundo por uma visão míope e limitada, terá apenas uma consequência. A alienação. Eu sinto ao afirmar que o mundo não precisa de alienados, mas sim de despertos, conscientes de onde e como estamos, de onde e como viemos parar aqui, para que possamos unir forças e através de muito esforço e trabalho duro, possamos criar uma nova e melhor realidade para as próximas gerações.

Em resumo, pense positivo, mas não pense que isso basta.