Milestone retorna ao Universo DC em grande estilo com equipe criativa invejável

Um dos grandes momentos do primeiro dia do DC FanDome certamente foi o anúncio de que a editora vai retomar o Milestone, selo dedicado à diversidade racial que foi casa de grandes heróis como o Super-Choque. Para o segundo dia do evento, a DC lançou de forma gratuita a revista Milestone Returns Zero, que reapresentou alguns dos principais personagens da casa em uma história que reflete os tempos atuais com invejável um time de artistas.

Antes de mais nada é importante contextualizar. Fundada na década de 1990, a Milestone Media foi uma iniciativa de grandes quadrinistas negros como Denys Cowan, Dwayne McDuffie, Derek T. Dingle e Michael Davis que tinham como objetivo aumentar a representatividade nas histórias em quadrinhos. Após lançar personagens como Ícone, Foguete, Hardware e mais, o selo chegou ao fim oficialmente em 1997, tendo alguns de seus heróis reintegrados ao Universo DC aos poucos.

Com exceção do Super-Choque, que ficou conhecido também nos desenhos animados, boa parte dos heróis e vilões não ganharam tanto espaço. Conscientes de que parte de seus leitores podem não estar familiarizados com eles, a DC decidiu então criar um one-shot – nome dado a histórias completas em uma edição – para reapresentar esse universo para marinheiros de primeira viagem. Essa é uma estratégia que já se provou um sucesso, considerando que o mesmo foi feito para o lançamento do Renascimento DC e do selo Sandman Universe.

O resultado foi Milestone Returns Zero, história escrita por Reginald Hudlin (Pantera Negra) com uma pequena participação de Greg Pak (O Incrível Hulk). Mais do que simplesmente resumir as origens dos primeiros heróis da nova leva do selo, a série deixa claro o tom das publicações, que vão levar em conta o momento atual da população negra nos Estados Unidos.

A trama começa com a jovem Raquel Ervin invadindo uma mansão desconhecida em busca de uma máquina de escrever. O que ela não sabia é que essa era a residência de um alienígena com dons especiais. Unidos, eles começam a combater o crime como Ícone e Foguete em uma busca de mudar o mundo – começando pela própria vizinhança, como ela mesma fez questão de cravar. Durante seu cotidiano heróico, o alien percebe o surgimento de outros supers como eles, e é aí que tanto a Foguete, quanto o leitor, são apresentados a figuras como Super-Choque, Duo e um novo vigilante misterioso.

Ao fim de suas 19 páginas, Milestone Returns Zero cumpre sua missão com louvor, compactando uma gama enorme de informações e origens de uma forma competente sem ser didática. É uma ótima forma de conhecer esse universo em uma narrativa ágil que deixa diversas pontas soltas para as HQs já anunciadas pela DC com lançamento previsto para fevereiro de 2021.

Outro mérito da publicação foi deixar claro que, assim como na década de 1990, a Milestone será um reflexo de questões da população negra da vida real. Não é de se estranhar que a edição ligue a origem do Super-Choque a protestos do Black Lives Matter ou dedique algumas páginas a um discurso emocionante do Ícone sobre como a falta de amor pelo próximo – uma forma didática de denominar a intolerância – é uma das principais razões para que a raça humana ainda seja considerada atrasada no Universo DC. Mais do que “lacrar”, essa é uma forma de manter o legado de um selo idealizado como uma forma de ampliar a representatividade nas HQs.

Como realidade e ficção se unem ao abordar racismo

Se o texto tem um alto nível, pode-se dizer o mesmo sobre a arte. Todo o time de peso composto por Jim Lee, Ryan Benjamin, Don Ho, Koi Pham, Scott Hanna e o próprio Denys Cowan brilha ao criar uma identidade coesa para esse universo em questão de poucas páginas. O destaque maior vai para Cowan, não apenas pela importância de ter o retorno de um membro fundador da Milestone, mas especialmente pela forma como seu traço ganha vida de diferentes formas ao lado de gigantes como Jimmy Palmiotti e Bill Sienkiewicz.

Ao fim dessas 19 páginas, é difícil não ficar animado pelo triunfal retorno da Milestone. Com uma gama de personagens interessantes e um grande respeito pelo passado do selo, é certo que esse é um dos maiores acertos da DC em 2020.