Mulheres, não há motivos para comemorações em 8 de março

Artigo escrito por Tânia Gomes*

Dia 8 de março é o dia internacional das mulheres. É possível que você, mulher, receba neste dia um bombom, um cartãozinho com palavras de carinho ou que lhe presenteiem com uma rosa e lhe digam que a mulher tem a delicadeza de uma flor e a força de um espinho. Isso poderá levá-la a acreditar que somos um sexo privilegiado. Lamento desapontá-la, mas 8 de março não é dia para comemorações.

No mundo inteiro, em países desenvolvidos e em desenvolvimento, as mulheres recebem menores salários; têm jornadas duplas ou triplas de trabalho; são sub representadas nos parlamentos e outras instâncias de poder; raramente ocupam cargos máximos de chefia e, além disso, são estupradas, violentadas e mortas: 35% das mulheres no mundo já foram vítimas de violência praticada, especialmente, pelos seus parceiros ou ex-parceiros íntimos: maridos, companheiros, namorados; 7% já sofreram abuso sexual.

Em 2019, a cada duas horas uma brasileira foi assassinada; 33% nas próprias residências; 68% eram negras, associando racismo e sexismo. Apesar da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, das Leis Maria da Penha e do Feminicídio, as violências contra as mulheres seguem acontecendo.

Como comemorar o 8 de março após o deputado paulista, Arthur do Val (PODEMOS/SP), viajar para a Ucrânia com dinheiro público e, no meio de um cenário de dor, enviar áudios aos amigos machos comentando que as ucranianas são “fáceis por serem pobres”? O macho escroto que, certamente, é defensor da família, do Brasil acima de tudo e Deus acima de todos pediu desculpas, feito menino levado.

As mulheres precisam se unir para vencer as desigualdades de gênero, mas não será jogando o jogo do contente que vamos vencer a guerra. A violação dos direitos das mulheres é uma realidade que adoece e mata. Muitas mulheres não se dão conta destas injustiças e reproduzem práticas sexistas, mas muitas sabem algo precisa ser feito. Algumas ações podem parecer pequenas, mas, somadas a outras, ganham importância. Assim:

– Considerando que o âmbito da política é uma das formas mais potentes de transformação social, JAMAIS vote em políticos que são contra os direitos das mulheres. Seus discursos não são “brincadeiras” e nem a misoginia (que eles não fazem questão nenhuma de esconder), é apenas “um jeitão” de ser.

– Ensinem os meninos a respeitarem as meninas. Homens que batem foram meninos ensinados a acreditar na superioridade masculina.

– Estimule as meninas a estudar, viajar e a escolher seus destinos sem medo. Ensine-as a sonhar grande e, principalmente, as ensine que cuidar do intelecto é mais importante do que ser escrava dos ditames da moda e das pressões estéticas sobre o corpo.

– Denuncie casos de violência contra mulheres na sua rua, no seu bairro, na sua cidade e acolha uma mulher que vive nesta situação.

– Quando souber que uma mulher foi estuprada NUNCA pergunte a que horas isto aconteceu, em que lugar e PRINCIPALMENTE que roupa ela estava usando. Que tais palavras nunca saiam da boca de outras mulheres.

– Nunca diga que o feminismo é “mimimi”. O feminismo é um dos mais importantes movimentos pela busca da dignidade humana de parte considerável da humanidade. Graças a ele podemos votar, ser votadas, estudar, ter salários e outros direitos importantes. Devemos, ao contrário, fortalecer os movimentos feministas e de mulheres para avanços futuros.

– Embora os livros teimem em registrar uma história pela metade, o mundo não foi construído apenas pelos homens. Procure conhecer histórias de mulheres potentes. Leia sobre Grace Hopper (cientista da computação); Marie Curie (prêmio Nobel de física e química); Rosa Parks (ativista contra a segregação racial); Brites de Albuquerque (administradora de capitania hereditária no Brasil colonial); Tereza de Benguela (líder de quilombo) e tantas outras mulheres maravilhosas raramente lembradas nas escolas, porque nenhum currículo é neutro e se interessa em manter o status quo.

– Reconheça a beleza dos quadros de Diego Rivera ou das esculturas de Rodin, mas não esqueça a potência artística de Frida Khalo e Camile Claudel.

– Dê de presente para uma menina o livro “100 mulheres que mudaram o mundo”, “Mulheres extraordinárias que mudaram o Brasil” e “Histórias de ninar para garotas rebeldes”.

– Acredite na sororidade e saiba que este termo significa contribuir para o empoderamento feminino, mas, muito cuidado, sororidade não é a obrigação de gostar de todas as mulheres, porque há aquelas que são mais machistas do que muitos homens.

 – Saiba que, nos últimos anos, em diversos países, as mulheres conquistaram muitos direitos, mas a vitória só virá quando a equidade de gênero for uma conquista de todas. Precisamos nos empoderar conjuntamente. Por isso, estão inclusas aí as mulheres lésbicas e trans, vítimas de atrocidades resultantes da homofobia.

– A fala feminina costuma ser interrompida ou não ouvida. Nestes casos, fale alto u grite e não tenha a preocupação de que lhe considerem nervosa, estressada ou louca.  

Recuse bombos e flores no dia internacional das mulheres e explique à pessoa que lhe faz o gesto de carinho a razão de seu posicionamento. Se a pessoa não lhe entender, tenha certeza de que você fez a coisa certa.

 Por fim, por Mariele Franco, Mariana Ferrer, Maria da Glória (Magô), Eliane Pedrina Henriques e tantas outras mulheres que perderam suas vidas e milhares de mulheres e meninas que seguem sofrendo violências físicas, sexuais e psicológicas todos os dias, ao redor do mundo, não comemore o dia 8 de março!!! Não ainda. Talvez um dia!!!!

*Dra. Tânia Gomes, historiadora. Presidente da Comunidade Social Cristã Beneficente (Comunidade do Dr. Osvaldo)