“Fogo cruzado”

O segundo mandato de Romualdo Batista  (PDT) está conturbado desde o começo. Como abordado pelo Jornal Agora em maio do ano passado, a relação do chefe do Executivo com o vice, Ari Stroher (MDB), e o empresário Marcos Jovino (PSB), se transformou em uma espécie de guerra fria.

Na última semana, a crise política local ganhou um novo capítulo, com manifestação realizada em sessão da Câmara de Mandaguari. Moradores se reuniram no Legislativo para cobrar dos vereadores melhorias na saúde e “pedir a cabeça” do chefe do Executivo.

O prefeito atribui a organização da manifestação aos ex-aliados, admitiu que a cidade precisa de melhorias e pediu ajuda para “fazer o que precisa ser feito”. 

Protesto
A manifestação pacífica começou pouco antes da sessão, às 19h30. Moradores portavam cartazes de “Fora Batistão” e também “Fora Vanessa”, pedindo a saída da secretária de Saúde, que está no cargo há pouco mais de três meses. Em sua fala, um dos líderes do movimento pediu a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a aplicação de recursos destinados à pasta.
A Câmara estava lotada, e sete pessoas foram retiradas do local após a sessão ser interrompida ao menos nove vezes. O regimento interno da Casa de Leis estabelece que manifestações são permitidas durante as sessões, porém de forma silenciosa, sem reações de apoio ou desaprovação ao que se passa no plenário.

Vereadores

O ato aconteceu semanas após os vereadores iniciarem diligências coletivas às Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município. Aliás, a resposta padrão adotada pelos legisladores na sessão foi “estamos fiscalizando, da forma como sempre fizemos”.
 

  • Nilton Boti (DEM), declarou que a população deve participar das sessões não apenas em momentos de manifestação, e que sempre devem levar suas dificuldades ao legislativo. Ele também disse que o pedido sobre a instauração da CPI seria “estudado com muito carinho”.

  • Sebastião Alexandre (PMDB), disse que “faltam bastante especialistas para atender nossa população”. Ele atribuiu à falta de médicos o número de filas em frente às UBS. 

  • Eron Barbiero (PSB) disse que cobra melhorias na Saúde desde o início da gestão. Também argumentou que é “um parto” conseguir documentos do município. 

  • “Mas o Ministério Público pede e numa semana chega. A gente solicita documentos e fica nessa embromação pra mandar”, disse. “A gente sabe que a gestão municipal está um caos”, complementou.
    Eron ainda afirmou que vai continuar cobrando o Executivo. “Indiferente de situação ou oposição, eu sou população. Se fosse o prefeito A ou B, não faria diferença. Não tenho rabo preso com vice, com ninguém, eu tenho é compromisso com a população”. E acrescentou “Se tiver qualquer indício de regularidade, faço a denúncia no Ministério Público”.

  • Clarice Ignácio Pessoa Pereira (PP) ressaltou que os vereadores fiscalizam desde o início do mandato, e disse que cassar Batistão seria “um tiro no pé”.
     “Quando você fala que a gente vai fazer essa CPI e de repente a gente tira o prefeito, eu poderia dizer que, pra mim, sem problema. Não votei no prefeito, não coloquei ele lá. Sou oposição e sempre fui, todo mundo sabe. Só que, de repente a gente não vai estar dando um tiro no pé também? Tirando ele nós vamos colocar o vice [Ari Stroher]”, declarou.
    “Não estou defendendo o prefeito, mas cadê o vice nessa história? Mentiu junto com ele. Não foram nas casas pedir votos juntos? Ele não deveria estar com o prefeito agora, tentando resolver o problema da população? Uma hora dessas ninguém sabe onde ele está. Não mentiram pro povo falando que iam trazer mais de mil casas? Que tudo ia ser humanizado, asfalto de primeira e até túnel nessa cidade ia ter? Cadê?”, questionou a vereadora.
    “Nessa hora é belezinha, ninguém sabe dele [vice]. Agora que ele devia estar ajudando o prefeito. Ele já foi prefeito, não foi? Tem mais experiência que o Batistão. É nessa hora que precisa de vice, ou ele é só de enfeite? Todo mundo tem que ajudar”, acrescentou 

  •  Jorge do Alambique (PDT) começou falando a respeito de processos correndo contra Batistão. De acordo com ele, a Câmara solicitou ao Ministério Público detalhes sobre as ações, mas o órgão respondeu informando que os processos tramitam em segredo de Justiça. 
    Sobre as reclamações da Saúde, Jorge lembrou das trocas de secretários na pasta, que somam cinco desde o começo do segundo mandato de Batistão. “Não é tirando secretária e colocando outra que vamos fazer a fila andar. Temos que dar condições, votar projetos. Colocar um secretário e não dar recurso é o mesmo que mandar alguém pra roça e não dar ferramenta pra trabalhar”, disparou.
    Quanto à eventual cassação de Romualdo, o legislador declarou que é necessário um motivo muito sério para que isso ocorra. “Colocar o vice [no poder] é o mesmo que por Brasília dentro de Mandaguari. Na hora de votar estava num palanque só, mas hoje cadê ele? Cadê os grupos políticos que batiam palma para o prefeito? Sumiram e deixaram ele com o abacaxi sozinho. Parem de contar mentiras, foram vocês que colocaram ele lá”. 
    O vereador falou ainda que, apesar de estar no mesmo partido de Romualdo, sempre foi oposição. “Ele tomou meu partido. Precisei entrar na Justiça para ter registro de candidatura. Denunciei o Romualdo muitas vezes no Ministério Público e se precisar denuncio de novo”. 
    Jorge concluiu sua falando fazendo uma comparação. “O prefeito me lembra uma porca que tenho lá em casa. Ela criou dezesseis leitões, mas só tem dez tetas (sic). Seis tão querendo matar a porca porque não conseguem mamar”.

  • O ex-presidente da Câmara, Jocelino Tavares (PT), disse que foi eleito vereador para fiscalizar. “E sempre fiscalizei, sozinho. Agora dessa vez reunimos todos os vereadores. Fomos todos às UBS para ver o que estava faltando. Tem gente falando que vai vir dinheiro e médico porque os vereadores estão fazendo pressão. Os vereadores sempre fiscalizaram”.

  • Tavares concluiu sua fala questionando a motivação do movimento de protesto. “Quem está por trás de tudo isso acontecendo aqui hoje? Qual a intenção disso?”, finalizou.

  • Luiz Carlos Garcia (PPS) declarou que os vereadores fizeram questionários e levaram em todos os postos de saúde do município. “Cada responsável de cada UBS respondeu o que estava faltando, desde papel toalha até equipamentos e profissionais. Entregamos na mão da secretária. A saúde não anda bem já faz tempo”.
    Garcia destacou que havia cartazes pedindo a saída da nova secretária, e lembrou que ao menos cinco nomes já passaram pela Saúde municipal. Ele alega que é necessário tempo para que a secretária desempenhe seu papel, e deu a entender que a manifestação tinha motivação política.
    “E outra coisa, como a Clarice falou, teria todos os motivos também para cassar o prefeito, pois não votei nele. Mas a partir do momento que fui eleito, sou do município, estou aqui para legislar e fiscalizar, e é isso que estamos fazendo. A impressão é que o mesmo grupo que colocou ele lá quer tirar agora, por briga política, por secretaria”, acrescentou.

  • Márcia Serafini (PT), secretária de Saúde no primeiro mandato de Batistão, a vereadora defendeu a permanência da atual secretária. “Quando temos interesse que a gestão no Executivo e Legislativo seja em conjunto, que de fato venha de encontro ao anseio dos nossos munícipes, não com interesse de grupos que utilizam de horas e momentos para fazer palanque eleitoral. Não adianta cobrar com mérito político. Não acho, de fato, que a solução é a retirada da secretária de saúde”.

  • O presidente da Câmara, Hudson Guimarães (PPS), afirmou, sobre a cassação de Romualdo, que “gostaria que entendessem que hoje, em especial, seria muito fácil navegar no mar da desgraça do Romualdo. Muitas pessoas manifestaram desejo expresso de que ele fosse retirado do governo de Mandaguari. Uma vez que somos eleitos autoridades dessa cidade, é nosso papel avaliar o que precisamos avaliar e tomar as medidas cabíveis, seja denúncias ou não. Não estamos aqui para engrossar o caldo daqueles que empunharam as bandeiras do Romualdo e que hoje estavam aqui empunhando cartazes de ‘fora Batistão’”. 
    Guimarães ainda acrescentou. “Não podemos estar à mercê de um grupo, ou alguns grupos de pessoas, que por algum motivo ligado à administração, seja falta de cargos comissionados ou destituição de cargos comissionados, resolveram partir para o lado oposto ao da administração. Não estamos aqui para endossar vinganças particulares ou pessoais, político-partidárias que tentam se levantar dentro desta casa. Estamos aqui para continuar um trabalho de fiscalização firme, que estamos fazendo, acompanhando todos os passos do Executivo”.

 

“Não sou e nem serei candidato”, diz Batistão

 

 

Ao Jornal Agora, Batistão deu a entender que o episódio da última segunda-feira foi usado como plataforma política, mas não “deu nome aos bois”. “Olha, tem pessoas que precisam disputar [a eleição] e talvez não tenham medido direitinho com quem discutir. Eu, por exemplo, não sou e não vou ser candidato. Então não tem porque ficar brigando comigo, tem mais é que me auxiliar a fazer um governo bem feito, deixar a cidade organizada”, comentou.
“Eu sei que, dentro desse contexto, tem pessoas que não estão conhecidas na cidade e precisam se destacar. Para eles a única forma é fazer esse alvoroço, para ganhar degraus e mídia e ser um pouco conhecido. Como você vai disputar se sequer é conhecido?”, acrescenta. 
Romualdo falou ainda que a suposta “tática de guerrilha” não surte o resultado esperado. “Mandaguari precisa sim, de melhorias, mas precisa de pessoas que trabalhem pra isso com entusiasmo e ajudem a melhorar, não com ataques”. 
Ainda na entrevista que concedeu à reportagem, Batistão solicitou apoio dos vereadores e de todos os grupos envolvidos na política local para resolver os problemas do município. O que a princípio parece um pedido público de ajuda para a cidade, trata-se na verdade de uma mensagem, a de que Romualdo está isolado e com poucos aliados
 

* Matéria publicada na 293ª edição do Jornal Agora