Os tortuosos caminhos da educação durante a pandemia

Reportagem publicada na 376ª edição do Jornal Agora

A pandemia trouxe diversos problemas para a vida de todos, mas uma das áreas mais afetadas foi a educação. Um enorme atraso educacional foi deixado na vida de crianças e jovens do mundo todo e especialistas dizem que demorará anos para que os alunos se recuperem desses dois anos perdidos.

Estima-se que, apesar de levar tempo, os alunos que ainda não terminaram sua formação vão poder recuperar o conhecimento perdido. Já aqueles que se formaram “aos trancos e barrancos” durante a pandemia, saem da escola sem a preparação necessária para vestibulares e Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).

Perguntado sobre se esses anos perdidos irão fazer falta na vida pessoal e profissional, o estudante Mateus Beneton, de 17 anos, não sabe ao certo o que dizer. “Só vou saber daqui para frente quando eu precisar”. Mateus terminou o ensino médio em 2021 e não voltará mais para o colégio, mesmo tendo uma grande defasagem escolar. A incerteza predomina e para ele esses anos foram perdidos, não só em questão de conteúdo, mas também nos relacionamentos e experiências que a educação presencial proporciona.

Para Ana Carolina Romano, de 17 anos, que também concluiu o ensino médio em 2021, os últimos dois anos foram praticamente perdidos e farão muita falta, pois ela pretende continuar estudando e entrar em uma faculdade. “Com certeza, lembro-me da professora falando assim nas aulas ‘Isso era para vocês terem aprendido ano passado, vou tentar resumir para continuar a matéria’. Foi um ano letivo perdido”, detalha.

Ambos fizeram o Enem esse ano e uma coisa que perceberam foi o baixo número de estudantes que se inscreveram para o Enem de 2020 e 2021, isso mostra a incerteza de estarem preparados o suficiente para a prova e também sobre o que será do futuro. “Dá para ver pelo tanto de inscrição que teve para o Enem na minha sala, esse ano teve umas 17 pessoas que fizeram e em 2020 foram só 4 ou 5 pessoas, de 40 alunos. A pandemia atrapalhou muito isso dos estudantes fazerem essas provas para ter uma bolsa de estudos na faculdade porque antes tinha cursinhos e aulas com os professores só focados nos vestibulares, para ajudar os alunos a estudarem. E durante a pandemia não teve isso, era só você e você”, conta Mateus.

Professores

Ouvimos o lado dos estudantes e agora precisamos ouvir o lado dos professores que tanto se esforçaram para driblar a pandemia durante os anos letivos e que saíram da sua zona de conforto para que os estudantes não fiquem totalmente desamparados. E que mesmo trabalhando o dobro com as escolas fechadas, são desvalorizados e injustiçados tanto pela sociedade quanto pelo governo.

Durante a pandemia os professores não pararam de trabalhar nem por um mês sequer pois precisavam se adaptar ao modelo EAD (Ensino a distância) para poder ensinar os estudantes e não abandoná-los nesse momento tão difícil. Mesmo as autoridades tentando nos fazer pensar que eles não são importantes, eles foram verdadeiros pilares durante a pandemia e não receberam nada a mais por isso além, é claro, da falta de apoio e ajuda do governo.

A equipe do Jornal Agora entrevistou três professoras do Colégio Estadual Vera Cruz (Cevec). São elas Valdeni Munhe, diretora, Livia de Fátima Jacomini Machado, coordenadora de curso, e Marlene Ananias, também coordenadora de curso.

O primeiro problema enfrentado pelos professores foi saber se adequar às novas tecnologias que não eram usadas no ensino presencial. Tínhamos internet e computador em casa, mas era uma coisa restrita para nós enquanto pessoa e de repente de uma hora para outra precisamos ver isso como uma ferramenta de trabalho. Essas ferramentas vão muito além de ter só um computador e uma câmera para trabalhar, vai muito além porque tem alguém do outro lado da tela. Teve uma hora que nós não sabemos se éramos professoras ou youtubers. Eu preparava minha aula cheia de vídeos, slides e outras coisas e chegava na hora e nada funcionava, isso me deixava muito nervosa, porque é muita dificuldade com as tecnologias. A pandemia nos trouxe muitas coisas ruins, porém nos trouxe uma coisa boa que é o crescimento forçado e doloroso em termos de conhecimento dessas tecnologias”, relata Valdeni.

Outro problema muito recorrente era a falta de recursos para dar as aulas e muitos professores tiveram que tirar de seu próprio bolso para poderem dar as aulas. “No início todas as tecnologias eram nossas e saíam do nosso bolso, atualmente ainda tem professores que estão pagando notebook que compraram para dar aulas em 2020 e 2021 porque por parte do governo não nos foi disponibilizado nada para trabalharmos. Agora temos algo, mas não é dos melhores”, complementa Lívia.

No lado social, se agravaram ainda mais a fome e a insegurança alimentar, que atingem muitos estudantes em todo o país. Em Mandaguari não foi diferente, relata a professora Marlene. Como os contratos de merendas estaduais estavam mantidos, educadores se mobilizaram para dividir em cestas básicas e dividir a cada duas semanas para famílias de alunos em situação de vulnerabilidade.

“Há muitos alunos que não tinham alimento em casa, e muitas vezes comiam apenas a merenda na escola. Com as cestas básicas vindas do que ficava na escola durante o período de fechamento, tentamos evitar que os estudantes passassem fome”, aponta Marlene.

Para as professoras ouvidas pelo Jornal Agora, 2021 fecha um ciclo tortuoso, de incertezas. E vem por aí 2022 com um desafio ainda maior, o de manter os alunos de volta na escola e ajudar a recuperar tempo e conhecimento perdidos.