Dia dos pais

A semana dos dias dos pais foi muito marcante para João Juvêncio. Enquanto dirigia para o trabalho, pensava. Como acontecerá? Entre uma marcha e outra no veículo, olhando para a Avenida Industrial, pôde ver, meio embaçado, pelo retrovisor, na distância do tempo, outra semana, antiga, bastante angustiante.

Ele procurava nas lojas, dia após dia, um presente adequado para o jeitão do seu pai.  Enfrentava toda forma de indecisão. Numa loja, era um barbeador. Na outra, uma marca nova de perfume. Uma gravata, indicava uma colega balconista do turco.  Um sapato, sugeria a Mitiko da grande Sapataria.

Embolado, o dinheiro no bolso suava. O temor era o pior. Acreditava que seu pai não ia gostar de receber  presente. Sempre fechado em si. No fundo do quintal ou no quarto. Nos dias de folga. E se não desse? O velho ia se sentir esquecido? Traído?

Mas, tudo indicava que nem abriria a embalagem. Não discutia nem futebol. Sempre tinha uma sentença pronta.  A irmã mais velha tinha até se mudado para Maringá para não enfrentar as ideias do velho.  O caçula nem sabia de nada da vida. Com quem trocar ideias?

Subiu por várias vezes a Avenida, olhando vitrines, sentia que já estava incomodando as gentis atendentes dos bazares. Duas noites , se virando até tarde na cama. Qual presente? Tinha juntado o dinheiro, meses a fio. Não julgava que ia ser tão  difícil. O pai vai jogar em cima do guarda-roupa. Vai passar um sermão. Aplique melhor o dinheiro. É por isso que o país não vai pra frente.

Ele sempre repetia esta frase quando ficava nervoso com alguma coisa nova. A decisão veio na marra. Como ia saber? Só experimentando. Foi o conselho do amigo Benê, centro avante do aspirante do Flamenguinho.

Domingão chegou. O aroma da macarronada partia do fogão. Tomava toda a casa. A mãe, no fogão a lenha, marcava as horas com seus passos de chinelo antigo. Só podia ligar o rádio bem baixinho. Ela ficou olhando para o filho. Também estava em dúvidas quanto ao resultado do presente?  Passou-lhe a mão entre os cabelos e continuou. Sem parar. Não podia parar. Eram muitas tarefas para dar conta.

Quando o pai chegou da feira livre, trazendo ovos, verduras e um frango caipira, João Juvêncio tremeu. Era chegada a hora. Estacou diante do enigma. Preferia não ter comprado o presente.

Emudecido, sentado à mesa, o pai descascava amendoins para torrar. A mãe abandonou por um momento seu posto ao fogão.  Chegou para o marido. Não vê? O  menino quer te entregar um presente. João sentiu-se empurrado. Uma força incrível o lançou na direção daquele homem.

O pai abraçou friamente o filho. Abriu o embrulho como quem não sabe abrir uma ternura.  Olhou com coragem o menino. Depois abraçou o novamente. Agora mais quente. Mais longo. Longamente. Tentou falar, enrolou palavras desentendidas. Acariciou o cabelo do menino. Ia beijá-lo. Mas, andou rápido para o fundo do quintal. Não conseguiu entender aquela lágrima esquisita correndo até o bigode.

Agora, João Juvêncio se preparava para outro Domingo. Só que ele era o pai. Surpreendeu durante a semana algumas pistas que o filho e a filha deixavam.  Ia saber recebê-los com um longo abraço?

Claro que ia. Mas os filhos sabiam que alguma coisa amarga o torturava no Dia dos Pais. Chegando o domingo. Eles vieram logo cedo. Alegres. Gratos. Saltando lhe ao pescoço. Mas, antes que o pai lhes desse um abraço, foram logo avisando: Para o senhor não ficar com aquele olhar janela a fora, feito bicho d’água, compramos também um presente para o Sr Aristides, desempregado, pai do Faustino.

Aí, que o coração de João Juvêncio apertou mesmo. Abraçou os filhos com a ternura de todo o coração, controlando a lágrima que poderia lhe molhar os bigodes. A inocência dos filhos comprando um presente a mais, a janela do cozinha olhando para o bairro pobre. Sorte que sua mulher adivinhou tudo e chamou todos para a macarronada. Na mesa.