Um realista esperançoso

Artigo escrito por Vinícius Grilo*

Certa vez perguntaram a Ariano Suassuna (grande dramaturgo brasileiro, escritor do Auto da Compadecida) se ele se considerava um pessimista ou um otimista. Ele então respondeu que “o otimista é um tolo, o pessimista, um chato, melhor mesmo é ser um realista esperançoso”.

Essa resposta de Ariano me acompanha já há muitos anos, mas poucas vezes me pareceu tão pertinente quanto agora, enquanto me debruço sobre o papel para propor uma reflexão sobre 2021. Isso porque, caso desejasse, não me faltariam elementos para fazer uma leitura deste ano de forma absolutamente pessimista: bastaria dizer que vivemos a maior crise social, ecológica e de saúde da história recente do Brasil.

Se fosse minha intenção, entretanto, poderia trazer à tona os incontáveis exemplos de solidariedade, as histórias de superação, os gigantescos avanços tecnológicos e científicos que, justamente, o singular momento pelo qual passamos, potencializaram e evidenciaram.

Olhando para frente, poderia enxergar a ampla vacinação no Brasil, a consequente diminuição no número de casos e um suposto retorno à normalidade ou poderia me ater às novas variantes oriundas de países com baixa adesão à vacina, seja por questões econômicas ou culturais.

Para onde olhar, então?

Melhor ainda: é possível escolher pra onde olhar, se a realidade me apresenta todos esses elementos: os otimistas e os pessimistas?

Mas voltemos ao Ariano: “melhor mesmo é ser um realista esperançoso”.

E o que é a esperança senão uma crença de que o futuro será melhor, de que as dificuldades serão superadas e que alcançaremos as coisas que desejarmos? Bonito né? Mas a “esperança” também é uma característica daquele que “espera”, e é por isso que, para Ariano (e pra mim), é necessária uma boa dose de realismo a esse sentimento.

É indispensável que cravemos nossos pés na realidade, que entendamos as causas de nossos problemas e de nosso sofrimento para que, a partir daí, possamos nos movimentar na direção de superá-los.

E agora que já expus minha concepção, meu método, sobre como avaliar 2021, peço licença para dar minha opinião:

Nós não vivemos uma crise ecológica, sanitária, social, educacional por outro motivo senão devido a (igualmente em crise) política. Ela mesma: nossa redentora e nossa algoz, nosso amor e nosso ódio, nossa necessidade e nossa repulsa: a política.

Independente de nossas reflexões individuais, de nossas decisões pessoais, a política afeta a vida de todos e é por isso que meu desejo é que, em 2022 (que é ano eleitoral) nós possamos discutir cada vez mais sobre política. Que possamos avaliar profundamente o que ela hoje nos oferece e o que pretendemos para o futuro. Que possamos entender seus mecanismos, seu funcionamento e que isso faça com que, cada vez mais, ela nos represente e sirva aos nossos interesses.

Eu sei que esse desejo e essa proposta soam bastante antipáticos a um povo que se sente tão machucado e desacreditado com as instituições, mas ainda assim, acredito que é um apelo indispensável e que deve sempre ser sempre repetido: alguém estará sempre fazendo política, então que sejamos nós.

Prefiro me sentir, frente a essa realidade, como Ariano se sente frente ao mundo. Não um tolo otimista (para não ser enganado), não um chato pessimista (para não desistir), mas um realista esperançoso (daqueles que não espera muito).

*Vinícius Grilo: Publicitário, Psicólogo e Vacinado