“Onde tem roda de viola, eu tô no meio”

A trajetória musical de Luiz Carlos Garcia, 69 anos, começou muito antes de qualquer estúdio, quando ainda menino, na Gleba Benjoim, onde escrevia versos e pequenas poesias na zona rural onde cresceu. Mas a carreira como compositor tomou corpo em 1990, ano em que sua primeira canção foi gravada pela dupla Sidney & Sérgio, de Maringá. A partir dali, abriu-se um caminho que ele próprio descreve como “feito de teimosia, paixão e um bocado de sorte”.

Depois da estreia, vieram outras duplas regionais como Ademir & Adriano, Márcio & Mara, Evandro & Eduardo, além de artistas que ele sequer chegou a conhecer pessoalmente. “A gente manda pra editora, a editora distribui. De repente, aparece gravação até de fora”, conta.

Ao longo dos anos, Garcia acumula 48 músicas gravadas, e mais de 100 guardadas à espera de um intérprete. Ele compõe letra e melodia, quase sempre começando pela linha musical. As primeiras gravações são feitas de forma simples, no violão, com apoio do amigo Fernando Figueiredo, que é músico e é proprietário de um estúdio de gravação. Quando necessário, investe em arranjos produzidos em São Paulo.

Mas a estratégia não se limita ao envio para editoras, “Eu mesmo vou atrás dos artistas. Se tem dupla tocando na região, eu apareço com as músicas na mão. Já entreguei até pro Chitãozinho, lá em Colorado”, relembra.

Escolta de Vagalumes

Entre tantas obras, nenhuma se iguala à repercussão de “Escolta de Vagalumes”, composta em 1999. A música ganhou sua primeira versão com Everardo & Marquinhos, dupla de Cambira, e em seguida foi regravada por diversos intérpretes, entre eles Rick & Renner, Sérgio Reis, Jader & Jefferson, Bruna Viola, Fátima Leão e muitos outros.

O alcance da canção foi tão grande que ela acabou entrando na trilha da novela “Canaviais e Paixões”, do SBT, garantindo ao compositor retorno contínuo ao longo dos anos. A parceria na obra é compartilhada com Zezete, que à época cantava com o filho de Garcia, Ricardo.

A música nasceu de um cenário que praticamente desapareceu, “Hoje quase não se vê vagalume. Nem borboleta aparece. Não sei ao certo, não se vê mais.”

A origem rural aparece como tema recorrente em suas letras. “Sou nascido e criado na roça. Muitas músicas falam desse universo”, explica, Garcia sobre o método de composição. A melodia quase sempre nasce antes das palavras. A afinação final é feita com ajuda do filho, quando surge alguma nota musical mais complexa.

De acordo com ele, das 48 músicas gravadas, quatro são as que têm maior circulação, sua composição mais famosa, Escolta de Vagalumes, Asas da Imaginação, gravada por João Moreno & Mariano, O Xote do bem-te-vi Bentivir e Outro Inverno, lançada recentemente e com boa repercussão no estado de São Paulo.

Mas, para ele, o grande combustível nunca foi o retorno financeiro, e sim o prazer de compor. “Dinheiro ajuda, claro. Mas a música é alegria. Onde tem roda de viola, eu tô no meio.”

Ídolos, encontros e frustrações

Entre suas referências, nenhuma supera a dupla Milionário & José Rico. Garcia chegou a conhecer o lendário Zé Rico quando este esteve em Mandaguari para encomendar bonés em uma fábrica local. “Ele ouviu minha música ‘O Espelho’ no carro, foi daqui até uma fazenda que ele possuía ouvindo. Queria gravar. Aí aconteceu dele morrer antes.”

A canção, aliás, foi finalista do festival Viola de Todos os Cantos, promovido pela EPTV, filiada da rede Globo que fica no interior paulista e mineiro, chegando ao quarto lugar na final em Varginha.

Garcia relata que em certas ocasiões a experiências foram menos inspiradoras. Ao levar composições para Gian & Giovanni, ouviu de um produtor que poderia incluir uma música sua no disco, mediante uma contrapartida financeira que ele não tinha como arcar. “Eu não tinha nem dinheiro pra passagem na época”, recorda.

O sertanejo de ontem e o de hoje

Sobre a nova geração da música sertaneja, Garcia é direto, “Fala muita besteira, muita cachaça. Não gosto. Gosto de coisa que a família pode ouvir.”

Ele diz que até duplas conhecidas pedem “algo no estilo atual”, mas admite, não compõe nesse formato.

Mesmo afastado do circuito de grandes gravadoras, o compositor segue enviando material para jovens artistas. Entre eles, a dupla Rogério & Regianne, apadrinhada por Luciano, da dupla Zezé Di Camargo & Luciano. “Pegaram cinco músicas minhas. Se uma entrar no disco, já vale”, afirma.

Também mantém colaborações com músicos locais, como Beto Costa, com quem dividiu a composição de “Galáxia de Amor”, hoje tocada em rádios da região.

Luiz Carlos Garcia nunca lançou disco próprio, garante não cantar bem, mas viu o filho Ricardo gravar dois CDs e interpretar diversas composições suas. Apesar de não viver exclusivamente da música, acredita que parte de sua história está registrada em cada gravação que conseguiu emplacar.

“Meu sonho era ver o José Rico gravar minha música. Não deu tempo. Mas eu continuo escrevendo. Enquanto vier inspiração, eu sigo,” finaliza.