Histórias que o tempo não apaga

Quando assumi o desafio de editar o Jornal Agora, não foram as pautas da semana, a escolha dos colunistas ou a montagem da capa que mais me tiraram o sono. Esses dilemas fazem parte da rotina jornalística e, com o tempo, a gente aprende a enfrentá-los — embora jamais estejam “resolvidos”. Sempre há um texto a ser melhorado, um título que poderia ter sido mais preciso, uma entrevista que renderia mais uma pergunta.

O que mais me exigiu sensibilidade, curiosamente, foi a página 2: o expediente. Nela circulava um dos espaços mais simbólicos do jornal, o quadro “Memória em Imagem”, que reunia fotografias antigas de Mandaguari e, com elas, fragmentos do passado. Algumas vezes as imagens vinham acompanhadas de relatos de leitores. Outras vezes, a redação mergulhava em arquivos e conversas para tentar reconstruir os detalhes que faltavam. Publicar uma foto ali era mais do que ilustrar uma página: era decidir que aquele momento específico merecia atravessar gerações.

À primeira vista, poderia parecer uma tarefa simples — escolher uma imagem, apurar um contexto e publicar. Mas não era. Aquilo exigia cuidado. A responsabilidade de tratar com respeito e precisão um episódio que marcou a vida de alguém ou da cidade inteira não é pequena. Em alguns casos, nos faltava espaço para fazer justiça ao que se queria contar. Em outros, era a falta de registros que impunha o desafio. E ainda assim, toda semana, aquela seção nos lembrava por que a imprensa é tão necessária.

Parte essencial do trabalho jornalístico é a documentação da história. Não raro, quem está do lado de cá do balcão, escrevendo reportagens e organizando conteúdos, nem se dá conta de que está, na prática, moldando a forma como os fatos serão lembrados. A escolha de palavras, o destaque dado a certos eventos, o cuidado em preservar os nomes, os rostos, as lutas… tudo isso contribui para que uma comunidade possa se reconhecer em sua própria trajetória.

Enquanto vivi em Mandaguari, acompanhei acontecimentos que, em maior ou menor grau, marcaram a cidade. Entre eles destaco o surgimento do movimento Tarifa Zero, em 2017; duas eleições municipais, em 2016 e 2020; e o avanço da pandemia de Covid-19, que mudou rotinas, separou famílias e exigiu um esforço coletivo que nunca será esquecido. Contar essas histórias a partir da redação do Jornal Agora foi uma experiência que me marcou profundamente.

Hoje, ao celebrarmos os 88 anos de Mandaguari, penso no valor das histórias que formam a identidade de um povo. Cada rua, cada comércio antigo, cada nome que batiza uma escola ou praça tem algo a dizer. A cidade tem muitas camadas e personagens — e a imprensa local, quando cumpre seu papel com seriedade, ajuda a manter essa memória viva, acessível, compreensível. Mandaguari tem algo de único, e merece ter sua história contada com o cuidado que se dá às coisas que importam.

Fico feliz por ter feito parte dessa construção, ainda que por um trecho do caminho. A história da cidade continua a ser escrita todos os dias. Que nunca nos falte quem a registre, e quem a leia.

Roberto Junior foi editor do Jornal Agora de 2018 a 2023.