The Wall e seus 40 anos

Certa vez um site inglês de cultura fez uma enquete querendo saber dos seus leitores qual era a distopia preferida da maioria. E na opinião dos seguidores, venceu The Wall, do Pink Floyd. Em segundo lugar ficou com 1984, de George Orwell, seguido por Fahrenheit 451, de Ray Bradbury. 
Em novembro o álbum chega aos 40 anos do seu lançamento e a obra continua cheia de significados. Uma concepção de Roger Waters, o baixista e vocalista, irado e politizado, The Wall teve pouca colaboração dos companheiros, especialmente do guitarrista David Gilmour. 
Era o auge das brigas internas, e a desintegração do grupo começava ali, com a demissão do tecladista Rick Wright durante as gravações, e o produtor Bob Ezrin afundado nas drogas. Ainda assim, o disco é um dos pontos altos do rock, com seu preciso apontamento das dificuldades de comunicação que atingem o ser humano na modernidade, na educação amarrada e encaixotada com conceitos arcaicos e radicalização política cada vez maior na sociedade, sempre tendendo para o autoritarismo.
The Wall ainda é uma obra fascinante porque remete a todos os nossos medos diante da evolução política e do pensamento político após a Segunda Guerra Mundial. O fim da Guerra Fria e a implosão do mundo comunista apontavam para uma era em que a economia daria as cartas, mas politicamente entraríamos em uma época mais serena, onde a democracia seria a vanguarda, ainda que focos autoritários e pensamentos mais conservadores perdurassem em algumas regiões do planeta.
O disco era um doloroso lembrete de que, se havia otimismo com a derrocada de várias ditaturas totalitárias e com o aparente desgaste da Guerra Fria, por outro lado sempre havia o risco do retorno ao nacionalismo e a possível ascensão do fundamentalismo religioso/ideológico. 
As músicas tratam a história de vida do protagonista Pink, baseado em Roger Waters. A narrativa inicia-se pela sua infância com a ausência do pai, morto durante a Segunda Guerra Mundial. Pink é oprimido pela mãe superprotetora, e atormentado na escola por professores tirânicos, autoritários e abusivos. Cada um desses traumas se tornam os tijolos no muro. O protagonista se torna uma estrela do rock e suas relações são marcadas por infidelidade, uso de drogas, e explosões de violência. Como seu casamento desmorona, ele termina a construção de seu muro, completando o seu isolamento do contato humano.
Escondido atrás de sua parede, a crise de Pink aumenta e culmina em uma performance alucinante no palco. Nela, ele acredita ser um ditador fascista. Envolvido por culpa, ele se coloca em julgamento, onde seu juiz interior ordena-lhe que mande abaixo o seu próprio muro e se abra para o mundo exterior. O álbum inclui várias referências ao ex-membro da banda, Syd Barrett. 
Durante cada show da The Wall Tour, um muro de doze metros de tijolos de cartolina era gradualmente construído entre a banda e o público. Lacunas permitiram que os espectadores vissem várias cenas na história, como animações sendo projetadas nas partes concluídas do muro. Vários personagens da história foram feitos como insufláveis gigantes, incluindo um porco, devidamente equipado com um logotipo composto por martelos cruzados. 
The Wall é o segundo álbum mais vendido do Pink Floyd, apenas atrás de The Dark Side of the Moon de 1973. 
Em 1982, três anos após o lançamento do disco, o filme Pink Floyd: The Wall é lançado, dirigido por Alan Parker, o roteiro foi escrito por Roger Waters. 
Rick Wright fora da banda desde a gravação do disco teve sua participação usada no filme e seu nome aparece nos créditos finais junto aos dos demais integrantes. O filme quase não possui diálogos e é praticamente todo acompanhado pelas canções do álbum, tornando-se um longo videoclipe de 95 minutos.
Com tons acinzentados e escuros que espelham a realidade daqueles tempos mórbidos e da vida de Pink. As cenas envolvendo soldados em combate e suas consequências são bem realistas e o figurino reflete bem a passagem dos anos. Os melhores segmentos da película certamente são as animações, sobretudo na belíssima Goodbye Blue Sky e na excêntrica The Trial, feitas pelo desenhista  Gerald Scarfe, que já havia as artes do disco The Wall e as animações da turnê.