Entre o projeto e a vida real: o que construímos até aqui?

Todo começo de ano a gente abre o calendário como quem abre um caderno novo: cheio de páginas em branco e aquela convicção de que, desta vez, tudo vai entrar nos trilhos. Prometemos fazer mais exercícios, economizar, ter mais paciência, organizar a vida… desejos tão bonitos quanto desenhos recém-feitos, ainda sem nenhuma marca do tempo. Há algo quase mágico nesse instante em que acreditamos que, só por virar o número do ano, tudo pode recomeçar com mais cor, mais ordem e mais entusiasmo.

Mas, como descobrimos rapidamente, entre planejar e viver existe um caminho cheio de surpresas, tão imprevisível quanto tirar um projeto da gaveta e transformá-lo em uma obra. Janeiro chega brilhando, com a energia de recomeço. Em fevereiro, já começamos a negociar com a realidade, percebendo que ela nem sempre respeita nossos prazos e nossos desejos. Em março, mudamos algo que parecia certeza. Em abril, descobrimos que nossa disposição para alcançar certos objetivos não era tão firme quanto imaginávamos. E no meio do ano estamos ali, reavaliando tudo de novo, respirando fundo, arrumando a bagunça e seguindo em frente, como quem reorganiza o canteiro de obras para não perder o ritmo.

A verdade é que nossos anos são como obras sendo construídas. Têm poeira, barulho, dúvidas, mudanças de última hora, dias que parecem não avançar… mas também têm aquele momento mágico em que algo começa a fazer sentido: um novo hábito que engrena, uma amizade que chega, um projeto que finalmente anda, um recomeço que nasce devagarinho e vai ganhando forma, como paredes que sobem quase sem a gente perceber.

Em 2025, não foi diferente. Eu, assim como muitos, mudei, cresci, recomecei e me renovei. Nem sempre do jeito que imaginava, claro. Mas quem disse que a vida precisa seguir exatamente o plano inicial? Muitas vezes, o melhor acontece justamente na adaptação, naquele desvio de rota inesperado que vira oportunidade, naquela solução improvisada que acaba funcionando melhor do que a ideia original.

E agora chegamos a dezembro, contemplando a obra que fomos construindo ao longo dos meses. Talvez não tenha ficado igual à imagem perfeita que fizemos na cabeça em janeiro. Mas, olhando de perto, há beleza nos acertos simples, força nos tropeços superados e poesia nos improvisos que fizemos para continuar, e que nos trouxeram até aqui, mais experientes, mais sensíveis e, de algum modo, mais inteiros.

Se tem algo que aprendi como arquiteto e urbanista é que nenhuma obra termina de verdade. Sempre existe um detalhe para melhorar, uma ideia para acrescentar, uma

parte que pode ganhar um novo brilho. E isso é maravilhoso: significa que estamos vivos, em movimento, sempre começando outra vez.

Que o próximo ano chegue como um terreno limpo e aberto, um novo canteiro de possibilidades. Que saibamos lançar boas fundações, revisar nossos caminhos quando necessário e, principalmente, celebrar cada etapa da vida como quem finaliza uma obra: com alegria, esperança e aquela certeza de que valeu a pena construir.

Feliz 2026! Que o novo ano nos permita construir, reconstruir e, acima de tudo, acreditar de novo.

Rafael Rossetto Ribeiro, arquiteto e urbanista, professor universitário do Centro Universitário Cidade-Verde (UniCV).